-Senta aqui no meu lugar…
Na hora não entendi bem o porquê daquilo.
-Não precisa, obrigada.
-Senta aqui que já vou descer.
-Tudo bem, então, obrigada de novo.
Ela pegou as sacolas que estavam acomodadas entre as pernas e saiu do assento cambaleando, com dificuldade.
Me sorriu e eu sorri de volta, grata pela gentileza. Peguei o celular e troquei umas mensagens, li duas ou três notícias, passei os olhos por alguns tweets. Uns 10 minutos depois, fui arrumar os cabelos e de lado enxerguei o vulto da mulher com as sacolas, parada perto da porta.
“Que caralho essa mulher ainda não desceu?”, pensei.
Passei rapidamente da satisfação de estar sentada em um busão lotado a um incômodo tremendo. Arregalei os olhos e coloquei as mãos na barriga para sentir se estava grande.
“Será que achou que eu estava grávida?”
“Ela deve ter calculado errado, achou que o ponto que tinha que descer era mais perto…”
“Segunda-feira começo uma dieta.”
“Ela vai descer já já, certeza.”
“Amanhã me inscrevo na academia.”
“Olha lá, agora ela vai descer!”
E não descia. E nunca que descia. Um gesto que foi acabando com a minha autoestima ponto a ponto.
Pronto, desceu! Um ponto antes de mim. Trinta e cinco minutos depois do “senta aqui que já vou descer”. Desceu e andou segura na rua, tinha certeza de onde estava. Eu olhando-a caminhar sem entendê-la. Onde foi que eu errei para receber essa gentileza?
Que lindo!