Sobre desfechos

Filho,

Eu não lembro bem qual foi o dia em que resolvi contar para os seus avós que estava grávida. Lembro do que aconteceu antes (sonhei com a minha avó me pedindo para contar), o durante e tudo o que veio depois.

Sei que se eu fizer um cálculo matemático, devo achar a data exata: eu estava grávida de 6 meses, encolhendo a minha barriga para ninguém desconfiar e me acostumando com a ideia de que, a partir dali, minha vida ficaria de pernas para o ar. Mas quem é bom de matemática aqui é você: eu sou muito ruim e o dia exato tampouco importa.

Naquela manhã eu nem consegui falar. Já contei essa história uma vez para você e já estive lá na minha memória milhares de vezes, mas até bem pouco tempo doía igual. Foi difícil transformar o meu desespero e a minha falta de ar ao encarar a minha mãe para contar a ela que, aos 18 anos, eu te carregava dentro de mim.

E eu me lembro a data exata em que esse momento específico da minha vida parou de me sufocar, em que consegui olhar para trás e sorrir: foi no dia 10 de março de 2017. Parece que foi ontem (e foi!).

Acontece que no dia 9 de março de 2017 eu lancei um livro sobre tudo o que o você me ensinou nesses 15 anos de maternidade. Do momento em que me acostumei com a ideia de ser mãe e contei para os seus avós até hoje, eu registrei o seu crescimento e o meu próprio. E isso virou um livro. E teve um lançamento. E foi memorável.

Tinha gente que nem era de São Paulo, teve amigo novo que conheci tem uma semana e amigo velho por lá. Gente que estudou comigo no pré, no primário, no meu ginásio, no colegial, na minha faculdade. Gente do meu primeiro, do meu segundo, do meu terceiro emprego e do atual também. Tinha vizinho por lá, tinha amigo de bar. Os amigos que o Corinthians e os Gaviões me deram. Os amigos que fiz na internet. Os amigos jornalistas. Quase toda a minha família. Amigos que fiz por causa de uns 4 ex-namorados e que se tornaram meus grandes amigos. Tinha ex-namorado que hoje é amigo. Teve gente que nunca tinha me visto, mas lia meus textos e queria me conhecer. Seus amigos da escola, muitos deles acompanhados das mães. Seus amigos que já não estudam mais contigo também. Tinha seu pai, a Thaís e seu irmão, que são da minha família. Seus avós vieram do interior. Seu tio fotografou por 4 horas para me dar de presente.

Tinha você, filho, que se sentiu TREMENDAMENTE importante e orgulhoso, autografando ali na mesa que o Lira Neto já havia renunciado.

Depois que você foi embora, ainda ficamos mais um tempo ali. A livraria fechou, mas rolou mais uma hora de autógrafos com portões fechados. Depois fomos expulsos e tive que assinar uns livros sentada na porta de uma lanchonete natural, lá pelas 23h30. E depois fui para o bar, onde dediquei mais alguns livros.

Foram duas horas e meia de fila que todas essas pessoas enfrentaram para me dar um abraço, ganhar uma dedicatória e vibrar junto comigo por essa conquista, que foi muito maior que um livro publicado. Foi o alívio de que tudo deu (e está dando) certo.

No dia seguinte, acordei ainda exausta e fiquei um tempo deitada. Você já tinha ido para a escola e seu avô se preparava para ir embora. Eu chamei seus avós na sala, ali no mesmo lugar em que contei que você estava vindo ao mundo, e só agradeci. Eu já sabia que essa aventura de ser sua mãe tinha sido maravilhosa, mas chegamos aqui e tudo deu muito mais certo do que eu esperava. E, se isso foi possível, foi por conta de toda a nossa rede de apoio, dos seus avós, do seu tio e de nós dois.

Quinze anos depois, olho para aquele dia que nem sei qual foi e respiro. A gente é foda, filho, e juntos somos imbatíveis.